Quando é que deixámos de construir castelos na areia? Aqueles só mesmo pelo prazer de entretenimento, sem segundas intenções.
O Verão tem estado em alta nas últimas semanas um pouco por toda a Europa e aquilo de que sinto mais falta é mesmo das brincadeiras inconsequentes na areia ou na água.
E não, não é só nostalgia de criança, é mesmo saudade de ser adulto não exausto e com tempo (e umas semanas de férias!).
Na verdade, a única coisa que me impede de ir ali brincar com a areia é mesmo o quanto chegamos cansados ao fim do dia.
Ah, isso e trabalhar em regime presencial a maioria dos dias, o que me leva a cerca de 3h totais em deslocações, mais 9h no trabalho (+ hora, - hora), mais preparar coisas para o dia seguinte, possíveis compras e etc… e lá fugiu o dia para o modo eu só quero ir dormir!! (Birra total de sono!!)
Mas há dias diferentes, em que é preciso aproveitar (ou encontrar) a energia para ir além do cansaço.
Nesses dias é tão bom sentir a liberdade de ser adulto sem manter as aparências.
Porque a verdade é que deixámos de fazer muita coisa por medo de julgamento, por crescimento forçado de “faz parte”.
Tens 30 anos, aqui está a tua taça de vinho, prospectos de crédito habitação, PPR e a lista de temas de conversa socialmente aceites para a tua idade.
Onde é que está aquele ser que adorava os dias e noites de verão, a pele salgada do mar, rebolar na areia ou ficar na praia até ao pôr do sol?
Muitos dizem “Cresceu”, mas a resposta honesta é “está ali escondido, sob o invólucro bem comportadinho de adulto”.
Vocês também usavam as caricas das garrafas para construir uma nave espacial na areia ou era só aqui a geek e companhia?
Talvez fosse influência de ter um irmão e primos um pouco mais velhos, de ver Star Trek, Star Wars e afins, mas não era só castelos ou pistas de corridas, havia também o cockpit da nave espacial com os seus imensos botões coloridos e alavancas de vários tamanhos e feitios (pauzinhos de madeira arrastados pelo rio ou mar).
Passava horas nisso. Depois juntava as conchas, pedras e caricas num pequeno balde ou saco e reutilizava numa outra brincadeira.
Há uns anos, fomos com um casal amigo à praia, ela, grávida de alguns meses, ficou na toalha a observar as “crianças” a brincar.
Nós, as “crianças” fomos construir uma pista de corridas, com castelo, fosso e outras coisas mais.
Primeiro, um ou outro olhar curioso, meio disfarçado, ao longe, depois algumas pessoas mais velhas a parar e a interagir connosco, até que por fim várias crianças (daquelas bem mais novas que nós), vieram perguntar o que era e como se brincava.
Os avós desses miúdos foram com eles pedir caricas e ficaram ali, a brincar com eles por algumas horas, ensinando alguns truques e partilhando memórias.
Quando saímos da praia, já outras crianças guardavam aquela nossa brincadeira, tentando impedir que a maré alta passasse além do fosso e tomasse a torre do castelo.
Foi uma boa lembrança de que as brincadeiras são intemporais.
O quanto eu me ria ao ser arrastada pelo areal fora em cima da toalha, pelo meu irmão. É uma sensação de alegria que relembro assim que deixo os meus pés afundarem-se lentamente na areia.
Nestes dias de calor vejo o mar de relance a caminho do trabalho, mas a minha imaginação corre solta, os meus dedos tamboreiam ao som das músicas no Spotify, às vezes sou mesmo parte daqueles “doidos” que se atrevem a balançar ou dançar ao som de uma música mais animada em plena plataforma do metro (o descaramento!).
Por entre as caras cinzentas de apatia e cansaço, tentam manter a compostura, ser adultos. Mas alguns anseiam por este tipo de liberdade.
Costumava ler no comboio/metro, mas depois ia perdendo o mundo em volta a acontecer.
Andava em modo piloto automático, sem ver caras ou situações, só sombras, um percurso pré-definido, quase me sentia uma ovelha a seguir o rebanho.
Em muitos dias, a brincadeira é uma realidade tornada em tela de cinema pela imaginação e sou eu quem controla a banda sonora.
Mas disperso-me, perdoem a ocasional incoerência de um texto escrito às 7h e pouco da manhã. (Já, já volto ao rumo)
Falava de castelos na areia, mas é muito mais do que isso. É sentir a alma solta e leve, dançar ou cantarolar, jogar, rir com vontade e sentir as bochechas avermelhadas do sol e do sal.
Porquê somente falar de coisas chatas, sérias e aborrecidas só porque pertence ao kit de adulto.
Com excepção do local de trabalho e mais uma mão cheia de situações, ser adulto é ter liberdade de sermos iguais a nós próprios e felizes.
Vão construir os vossos castelos, sintam o ritmo da música e ninguém vos obriga a segurar a taça de vinho com o dedo mindinho esticado (um chá gelado até saceia mais no calor).
Quase 8h, quase tempo de cumprir as horas obrigatórias do dia, mas as restantes, essas são livres e ao sabor da brisa quente do fim do dia.
Hoje talvez vá mergulhar os pés na areia.
Gostei dessa reflexão 👏
Que bom que gostou 😊
Obrigada por ler!